quarta-feira, 2 de julho de 2008

Cartas para Anita - Do teu e do meu caminho

(...)
"Literatura? As Letras? As palavras e sua imensurável força no mundo daqueles alfabetizados funcionais? Essa está cada vez mais a me seduzir e a me tentar a ficar de seu lado, trabalhando consigo. Vejo os vossos exemplos - tu, ele, Muni, Leo -, a força que vós tendes quando munidos das palavras, a sedução exuberante e as montanhas movidas. Nisso tudo minha ânsia de escrever se inspira, se alimenta e recria, sob minha visão de mundo, aquilo que acredito que deva ser dito. Por eu não ter acreditado que algo realmente tivesse que ser dito por esse tempo todo, um hiato gritante tomou conta dos meus escritos. A falta de vontade de me arriscar por terrenos que não conheço muito bem e a falta de vontade de quebrar as correntes que nos prendem ao mundo dos não-artistas igualmente contribuíram de forma negativa para essa construção.

"A despeito de tudo aquilo que é moribundo, creio que abri os olhos; creio que acordei. Apesar de saber que estamos continuamente acordando para novas fases da vida, sinto que agora é mais forte, mais forte do que tudo aquilo que já havia vivido antes. Há algumas estações minha vida tem se reinventado com uma proficuidade que me espanta: medo e regozijo se alternam a cada deitar e levantar do sol. Ontem meu reflexo me sorria um sorriso estranho, roubado de alguma criatura nebulosa de qualquer conto de Poe; hoje, quem me seduzia era o reflexo de um olhar vivo e sedento, um iluminado ríctus a expressar a presunçosa plenitude que se sentia. Presunçosa? Sim, posto que ainda não é o fim - de tudo. É o fim da temporada.

"Em menos de quatro dias me vida virou de cabeça para baixo; coisas que há muito havia esquecido deliberada e convenientemente - que estavam guardadas de forma segura em alguma gaveta de minha desorganização existencial - voltaram de uma só vez, como um jorro. Outro dia o fosse, eu teria lutado contra mim mesmo com todas as forças; afinal de contas, era meu mundo que saía do controle logo agora que as coisas estavam aparentemente, e apenas aparantemente, encontrando seu caminho. Todavia, o dia de hoje era diferente. Agora, levando em conta o imaginário de uma juventude, era como se uma película cinematográfica nos envolvesse. Tudo que sempre se sonhou. Alguns poderão dizer 'cuidado com ilusões', ou 'quanto maior expectativa, maior pode ser a decepção'. Decepção de quê? A vida é curta demais para fazermos planos substanciais a longo prazo: o que tiver que ser, será; e se um 'não' o for, ainda assim continuarei agradecido por pelo menos uma noite singular. A questão não é mais sobre o ator ficar no bolso ou não - esse, apesar de intrinsecamente comungado, sabe que seu lugar é nos metros de madeira que dão vida aos sonhos. A questão já parece ultrapassar a ansiedade da espera, também. A questão é, e na verdade sempre foi, saber viver um dia de cada vez, preferencialmente aproveitando da forma mais passional possível as oportunidades que abrem margem à realização dos nossos sonhos.

"Sinto meus olhos abertos, com sua angústia quase se esvaindo, sem medo do escuro da solidão que a qualquer momento pode atacar qualquer um; acima dos perigos mundanos, sinto-os prontos".

Um comentário:

[Leonardo] disse...

i'm speechless.
a tua sinceridade e capacidade imensa de expressão me emocionam. =]